terça-feira, 18 de agosto de 2009

O Funaná

História

O funaná é um género musical relativamente recente. Segundo a tradição oral, o funaná surgiu quando, numa tentativa de aculturação, o acordeão teria sido introduzido na ilha de Santiago no início do séc. XX, para que a população aprendesse géneros musicais portugueses. O resultado, no entanto, teria sido completamente diferente: seria a criação de um género novo e genuíno. Não existem no entanto, documentos musicológicos a corroborar isso. Mesmo assim, não deixa de ser curioso o fato de, mesmo sendo um género musical totalmente diferente, o uso da gaita e do ferrinho no funaná é análogo ao uso do acordeão e dos ferrinhos em certos géneros musicais portugueses (malhão, corridinho, vira, etc.).

Outras fontes, também de tradição oral, referem outra origem. Situam a origem do funaná no incremento da importação de acordeões como um substituto barato de órgãos para interpretar música religiosa. O funaná teria então surgido da adaptação para acordeão de outros géneros musicais então em voga.

O próprio nome «funaná» também é recente, e data provavelmente dos anos 60 e 70. Para uns, o nome deriva da palavra portuguesa «fungagá». Para outros o nome vem da junção dos nomes de dois exímios tocadores, um de gaita e outro de ferrinho, chamados Funa e Naná. As palavras mais antigas para designar o funaná eram «fuc-fuc» e «badju l’ gaita».

Inicialmente um género exclusivo de Santiago, durante muito tempo o funaná foi relegado para um contexto rural e/ou para as camadas mais desfavorecidas da população. Chegou mesmo a ser proibida a sua interpretação na capital, onde era a morna que gozava de prestígio e de um carácter nobre.

Mas durante a década de 70, e sobretudo depois da independência, houve tentativas de fazer ressurgir certos géneros musicais, entre os quais o funaná. A ideologia socialista do pós-independência, com a luta contra a desigualdade entre as classes sociais constituiu terreno fértil para o (re)surgimento do funaná, que até então era considerado música das camadas mais desfavorecidas. Essas tentativas não foram muito bem sucedidas sobretudo porque «o funaná não conseguiu desgarrar-se da coladeira»[carece de fontes?].

Foi necessário esperar pela década de 80 para que o conjunto Bulimundo e sobretudo o seu mentor Carlos Alberto Martins (mais conhecido por Catchás) viessem fazer ressurgir o funaná. Indo «beber» directamente à fonte (o interior da ilha de Santiago), Catchás aproveitou os seus conhecimentos de jazz e música clássica[carece de fontes?] para inventar um novo estilo de tocar o funaná, apoiando-se em instrumentos eléctricos e electrónicos, que viria a influenciar quase todos os artistas em diante. Graças ao sucesso do conjunto Bulimundo, o funaná foi exportado para todas as ilhas em Cabo Verde. Hoje, o funaná já não é visto como um género exclusivo de Santiago, sendo composto, interpretado e apreciado por pessoas de todas as ilhas.

Se os anos 80 foram os anos da divulgação do funaná em Cabo Verde, os anos 90 foram os anos da internacionalização. O conjunto Finaçon, nascido de uma cisão do conjunto Bulimundo, foi um dos responsáveis pela divulgação internacional deste género musical, graças a um contrato com uma prestigiada gravadora e distribuidora estrangeira. Não só o funaná passa a ser conhecido internacionalmente, como é também interpretado por conjuntos musicais no estrangeiro, cabo-verdianos ou não.

A nível de técnicas musicais não se registram grandes inovações ao «estilo Catchás», talvez apenas no que diz respeito à orquestração (exploram-se as possibilidades dos instrumentos electrónicos). Verifica-se também, nesta altura, a excessiva comercialização e banalização do funaná. Durante um ano, houve a tentativa de divulgar o funaná na França. Essa tentativa não teve sucesso porque tentou-se vender o funaná como «música de moda para dançar no Verão» (logo a seguir à lambada), e não explorar as particularidades etno-musicais do funaná.

A partir dos fins dos anos 90 assiste-se a um retorno às raízes, onde os conjuntos preferem interpretações com gaitas e ferrinhos autênticos (ocasionalmente adiciona-se um baixo, uma bateria e/ou uma guitarra). Um dos principais conjuntos dessa nova vaga é o conjunto Ferro Gaita.

Variantes do funaná

O funaná conta com diversas variantes, nem todas elas bem conhecidas, e nem todas elas conhecidas pelo verdadeiro nome. Eis a descrição de algumas variantes:


Modelo rítmico do funaná – kaminhu di ferru, ± 150 bpm.

Funaná kaminhu di férru
Esta é a variante mais conhecida do funaná. Geralmente quando se emprega apenas a palavra «funaná», refere-se a esta variante que obteve maior sucesso, sobretudo a nível de dança. Trata-se de uma variante que faz lembrar uma marcha, mas com um andamento vivace.


Modelo rítmico do funaná – maxixi, ± 120 bpm.

Funaná maxixi
O nome desta variante provavelmente vem do género musical maxixe que outrora esteve em voga em Cabo Verde. É uma variante parecida com a anterior, mas com um andamento allegro.


Modelo rítmico do funaná – samba, ± 92 bpm.

Funaná samba
Apesar do nome, esta variante não tem nenhuma relação com o género brasileiro samba atual. Parece tratar-se de uma adaptação do lundum às técnicas do acordeão. O andamento é mais lento (andante) e o ritmo é diferente das outras variantes do funaná, é bastante similar à toada.


Modelo rítmico do funaná lento, ± 96 bpm.

Funaná morna
Praticamente não é conhecido por este nome, é mais conhecido por como funaná lento. Parece tratar-se de uma adaptação da morna às técnicas do acordeão, com um andamento andante. Enquanto que, durante muito tempo, foi a morna (badju di viulinu) que gozou de prestígio em ambientes urbanos e salas nobres, em ambientes rurais desenvolveu-se, em contraposição, uma variante mais lenta do funaná (badju di gaita). Curiosamente, esta variante tem o mesmo andamento que a morna da Boa Vista e não da morna da Brava.

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